
Na primeira semana de aula, um sujeito foi logo jubilado da Escola (assim que os íntimos chamam a ETFRN, A ESCOLA). Esse elemento chegou na cantina e pediu uma coxinha. Como o atendente disse que ele tinha que pagar primeiro e trazer o recibo pra poder pegar a comida, ele nao gostou, deu um murro na estufa pra quebrá-la, meteu a mão no meio dos destroços e pegou a coxinha, degustando-a ali mesmo, com a mão toda ensangüentada, na frente do incrédulo servidor. Nunca mais tivemos noticias desse rapaz.
Mas os vandalismos nao ficavam somente nesse rapaz. Um outro de nome Clifton, simulava umas tosses tão altas que pareciam se tratar de um tuberculoso. Era o professor proferir uma frase, lá vinha um “purrute” gerado por Clifton.
Alexandre Belo, outro anormal, conseguia soltar flatos dos mais podres possíveis, ao simples toque na barriga. Se quisesse soltar cinqüenta em 10 minutos, ele conseguia. E todos com o mesmo teor destrutivo. Da mesma forma que conseguia acumular catarro verde com a mesma facilidade.
As aulas, principalmente as de matemática da saudosa professora Umbelina e as de física do grande professor Araújo eram as mais prejudicadas. Era um festival de bufas e purrutes que impossibilitavam qualquer explanação vinda dos professores.
Quando o professor conseguia um pouco de silencio, alguém pegava a bata de outro colega ou um caderno e arremessava no quadro negro, a centímetros da cabeça do professor em questão.
Um belo dia, numa risadagem sem fim que acontecia na ala de trás, o professor queria saber o motivo de tanta gargalhada. Eis que Rainer Patriota disse:
- Professor, estão perguntando aqui se o senhor gosta de tomar chá de minhápika?
- Chá de que, meu filho?, perguntou o professor.
- Minhápika, professor, minhápika.
A gargalhada foi geral. Mas isso foi demais pra paciência do professor Araújo, que se retirou da sala e exigiu que a sala inteira levasse suspensão. Levamos a tal suspensão e só pudemos assistir aula novamente se levássemos um dos pais pra uma reunião, e eles ainda tinham que assinar um termo de responsabilidade.
Os nerds ficaram doentes de raiva, dizendo que iriam entregar quem ficava peidando e quem ficava dando os purrutes, alem de que iriam entregar quem jogava objetos no quadro. Se calaram na primeira ameaça de uma surra bem dada.
No dia seguinte à suspensão, foi realizada a tal reunião. Minha mãe foi minha acompanhante nesse acareamento tão humilhante. Aí que foi meu erro, que foi o detonador de um fato que até os meus últimos dias de escola ainda era motivo de chacota.
Eu mentia pra ela com relação às minhas notas. Eu tinha obtido um três na primeira prova de matemática e um dois na primeira prova de física (na Escola fazíamos três provas no semestre, pra atingir 18 pontos). Mas pra minha mãe, eu disse que tinha um oito e um nove, respectivamente. Era fácil mentir, pois diferente do Neves, os boletins eram entregues aos próprios alunos, quando íamos buscar na coordenação do curso.
Começa então a reunião e feito todos os preâmbulos e considerações, foi dado a vez aos professores para que pudessem explicar os problemas específicos em seus casos.
A professora Umbelina, muito sábia, disse que a punição seria um processo natural, pois os alunos envolvidos nas bagunças estavam todos com péssimas notas e que se nao melhorassem até a próxima prova, com certeza seriam reprovados e que a reprovação era a punição máxima do aluno.
Nesse momento ocorreu algo inusitado. Minha mãe levanta o braço pedindo pra falar, aumentando ainda mais a minha vergonha. E ela diz, categórica:
- Professora, a senhora falou que os bagunceiros estão com notas baixa, nao é? Que quem tem notas altas nao faz parte da bagunça, nao é?
Diante da afirmativa da professora, a minha mãe emendou, solenemente:
- Então eu e meu filho vamos embora dessa reunião, que ela nao foi pra nós, afinal de contas um oito é uma boa nota, nao é? Se a média daqui é seis, eu considero um oito uma boa nota. Tenham um bom dia todos vocês.
Me pegou pelo braço e me puxou em direção a porta.
A professora, sem acreditar no que via, foi checar novamente a minha nota, mas antes que ela pudesse dizer qualquer coisa, nós já voávamos pra fora da sala. Elegantemente, a professora calou-se e nunca mais tocou no assunto. Em agradecimento, melhorei as notas e o comportamento. Mas até hoje ainda existem atores imitando o discurso de tão protetora mãe.