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Thursday, November 29, 2012

Ranyere endoidou

Voltamos ao começo da década de 1990. Em um belo dia de domingo, formamos um quarteto e começamos a beber exageradamente. Eu, Ranyere Rodrigues (Boca aberta), Alexandre Santiago (Tapuru) e Gustavo Porpino (Gugão).

Lá pelas duas horas da tarde iniciamos os trabalhos bebendo rum na casa de Tapuru. Lá pelas cinco, fomos então para o Bar de Dagô, beber cachaça pura. Na época, o point do domingo era a famosa batucada realizada no Hotel Residence. O Bar de Dagô ficava estrategicamente situado nas proximidades do Residence e lá ficávamos abastecendo até a hora de entrar na festa.

Gugão foi literalmente nocauteado, pois saiu de perto da gente sem ninguém perceber e arranjou uma briga em frente ao hotel e foi pra casa todo fudido. Agora só restavam três no exército de brancaleone.

Planejávamos ir à Ceará-Mirim após à batucada. Era praxe na época os homens irem à Ceará-Mirim nos domingos à noite, após saírem das casas das namoradas, pois esta cidade alem de possuir fama de ter muitos cornos, ainda tinha festas muito boas. A faca e o queijo.

Embriagados, éramos três apertados na cabine da saudosa Saveiro cinza do Boca Aberta. Fomos à minha casa, tomei banho, troquei de roupa e fomos à casa de Ranyere, que fez o mesmo. Quando chegamos à casa de Tapuru, o mesmo entra e não consegue sair mais de lá, devido ao alto grau etílico.

Mas, antes de chegarmos à minha casa, paramos em um cruzamento que morava uma garota camada Michelle. Tapuru começa a esculhambar essa menina a partir do nada. Sabe Deus o que deu na cabeça desse homem. Ele gritava: “Michelle, sua puta!!! Michelle, rapariga!!! Michelle... hfgjskenmsjends... hahahahahaha...”

O homem balbuciava coisas que nem ele mesmo entendia e caia na gargalhada, com cara de peixe morto. Uma comedia.

Éramos somente dois agora, cada um pior do que o outro. Eu particularmente já não acreditava que deveríamos ir, mas seguindo minha lógica de então, desistir seria coisa de frouxo. Percebi então que o Boca Aberta estava em pior estado do que eu e fiquei em estado de alerta. Ele dirigia, que beleza.

Chegando em Ceará-Mirim fomos beber cerveja em um bar nas proximidades da festa. Este bar estava lotado e nem vaga pra estacionar o carro achamos. Sentamos e logo em seguida, o carro que estava estacionado na frente do bar sai e Boca Aberta insiste em querer estacionar o dele na vaga, pra colocar música pra gente ouvir.

Fico na mesa sozinho e de repente, escuto um estrondo. Era Ranyere, que ao tentar estacionar o carro, derruba seis motos que estavam estacionadas, uma ao lado da outra.

Comoção geral no bar, todos correm e eu corro pra tentar salvar a situação, levantamos as motos, os donos putos querendo matar Ranyere, eu apaziguando e mantendo todos calmos. A situação era difícil, pois não éramos bem quistos na cidade, afinal, quem era de natal tinha mais chances com as meninas locais.

Miraculosamente, nenhum dano foi causado nas motos. Nem sequer um retrovisor quebrado. Coisas de Deus. Mas mesmo assim os caras estavam irredutíveis. Usei de todo o meu latim e consegui um salvo-conduto. Depois do sufoco, volto pra mesa e lá encontro Ranyere tranqüilamente bebendo, e me pergunta: “Estava aonde, porra? Estou aqui esperando por tu hà duas horas!!! Assim é foda, vai tomar no cu!!!”.

Eu nem tentei explicar pra ele o que estava fazendo, pois quando o mesmo derrubou as motos, desceu do carro, ligou o som, e elegantemente sentou-se à mesa. Fato este que irritou ainda mais os motoqueiros. Eles achavam que Ranyere estava sendo arrogante. Mas a verdade é que a embriaguez fez com que o fato dele derrubar as motos fosse desconhecido pra ele.

Chega então um bêbado de rua no bar e quando Ranyere viu que o cara tinha uma camisa de Zico, com os dizeres “Se futebol tem alma, o nome dela é Zico”, chamou o sujeito pra beber com a gente. Rany queria porque queria trocar sua camisa de mangas compridas, de listras amarelas e azuis, altamente manjada, com a camisa de Zico do elemento. O bebum se recusou veementemente. Sábia decisão.

Por uma grande coincidência, o bêbado recitava um verso que eu havia aprendido com meu avô Juvenal: 

“O Peido que a nêga deu”

“Ninguém viu o que eu vi
Debaixo da gameleira
Foi um tiro de ronqueira
O peido que a nega deu

Abalou todo o Assu
Ela tava mexendo angu
Passou a perna de lado
Deu um peido tão danado
Que quase não cabia no cu”

Foi somente a deixa. Ranyere ria tanto que despejava lágrimas. E pedia pro sujeito repetir. E repetir. E repetir...

Decidimos então não ir para festa alguma, devido à fatiga em estado avançado dos nossos corpos. Saímos do bar e quase Ranyere derruba as motos novamente. Fomos embora ao som de gritos enfurecidos dos presentes.

O Boca Aberta então resolve dar um cavalo de pau numa rua perto da saída pra estrada. Quem gosta de praticar essa peripécia ou quem entende um pouco de alguns princípios da física, sabe que ao finalizar um 180 graus, se o veiculo encontra-se em velocidade acima dos 60 km/h, o carro tende a sair de marcha à ré.

Dessa forma, para evitar que o veiculo saia descontrolado para trás, ou o sujeito aperta no freio ou então engata uma primeira e faz com que o carro vá para frente. Ranyere não fez nenhuma coisa nem outra. Resultado? O carro saiu de ré até encontrar uma calçada elevada e esmagar a tampa traseira da pick-up.

Decidi então tirar o homem da direção, que nem fez resistência. O problema é que tinha deixado meus óculos em casa e não enxergava quase nada, ainda mais à noite. Mais uma vez Deus nos brindava com uma sorte incrível. Gugão havia deixado os óculos dele pelo carro e foi exatamente o que eu usei. O grau dele era bem diferente do meu, mas era melhor do que nada.

Chegamos na minha casa e coloquei o cidadão pra dormir na minha rede. O sossego durou menos de cinco minutos. O bebum começou a passar mal, vomitou o quarto todo e lá pelas tantas da manha, estava de cuecas no banheiro, com meu pai dando banho nesse corno e ele com cara de choro e de cu ao mesmo tempo.

Na segunda-feira pela manhã, Aguinaldo, o pai dele, esperava pelo carro para ir ao trabalho. O bicho acordou naquela de querer consertar o carro, de não ter vontade de se levantar da cama, de querer se matar e não conseguia ver nenhuma saída.

Eu encorajei o mesmo a procurar uma oficina mecânica para consertar o carro para que o pai não visse o estrago. O mecânico trabalhou depressa e lá pelo meio dia, o carro estava pronto.

Pedi então para que ele me deixasse na Cigarreira do Pedro e fosse embora, pois seu pai devia estar louco procurando por ele. Desci do carro e eis que o sujeito desce atrás. Eu perguntei: “Tu vai pra onde, Ranyere? Teu pai vai te enrabar, bicho. É melhor você pegar o beco”.

Ele nada disse. Pediu uma coca-cola e um Pingo de Ouro à Pedro e sentou-se para juntar-se a nós pra uma partida de dominó. Depois de sentado, ele disse: “Rapaz, eu queria morrer aqui sentado, mas ir pra casa agora é foda. O que vou escutar do meu pai, não desejaria nem pro meu pior inimigo”.

E ficou por lá até eu voltar pra casa e ir dormir novamente, aumentando a raiva do pai, que aflito não podia ir trabalhar.

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