Após uma farra enorme, que terminamos de manhã no Bar e Restaurante Viver, situado em frente à Pittsburg
da Prudente de Morais, e que era da propriedade de um primo da minha
mãe, Miguel Ângelo, eu, Schiavo Álvares (Magrão), Augusto Benfica
(Coringa) e Staine Darlan, fomos pra minha casa, contentes com a
quantidade de bebida ingerida naquela noite. Ficamos na calçada por um
tempo, até que entrei pra beber água. Na cozinha, percebi uma bandeja
que meu pai havia comprado com 30 ovos. Quando voltei pra calçada, já
estava com a tal bandeja nas mãos. Não precisei dizer nada.
Schiavo
ofereceu o seu carro pra operação e tratou de pegar um pincel atômico
preto que carregava no porta-luvas e começou a desenhar outros números
por cima dos números originais da placa do carro. Sentei-me no banco da
frente, com Staine e Augusto no banco de trás. Cada um já tinha um ovo
na mão. O primeiro sortudo foi um cara que já não estava com muita
sorte. Tinha o seu carro, um fusca cor de laranja, quebrado e a tampa do
motor, que fica situado na parte de trás do veículo, aberta.
O
sujeito olhava pra dentro do motor, pensando que apenas olhando ele
iria fazer o carro andar novamente, quando de repente, um ovo bate na
polia da correia dentada e espirra todo o seu conteúdo mal cheiroso na
sua face, pois a sua cara estava praticamente dentro do motor. Foi um
tiro digno de um sniper. Num movimento sincronizado, dois outros ovos
atingiram o inocente cidadão, um batendo na sua cabeça e outro no
pescoço, quando o mesmo se virava pra tentar entender o que estava
acontecendo.
Há quem diga que Deus ajuda a quem cedo
madruga. O menino que vendia jornal no semáforo pode ser prova cabal que
esse ditado é curtíssimo. Num ato de maldade fora do comum, perguntamos
ao menino se ele queria ovo. Ele disse que não estava escutando. Falei
pra chegar mais perto. Quando este se aproximou, pensando que eu havia
dito que queria comprar um exemplar do jornal, eu avisei que estava
jogando um ovo e joguei o ovo nos peitos do jovem trabalhador. Foi nessa
hora que começou o trabalho divino.
O ovo bateu na
bata que o jovem vestia com o nome do jornal, bem no meio da caixa
torácica e milagrosamente, não estourou nele e caiu no chão. Sem
acreditar no que estavam vendo, na mesma hora, Staine e Augusto
resolveram pegar cada um seu ovo pra jogar no menino santo. Eis que
novamente o improvável aconteceu. Na euforia de alvejar o jornaleiro, e
assim como devido ao alto estado de embriaguez, eles foram pra mesma
janela e no frenesi, quebraram os dois ovos que carregavam em cima deles
e do banco do carro do magrão.
Fomos embora dali
depressa, antes que o carro pegasse fogo. Rodamos procurando outro alvo
potencial, até que chegamos no cruzamento da Bernardo Vieira com a
Prudente de Morais, vindo pela Bernardo em direção à Morro Branco. O
magrão embriagado para o carro ao lado de uma besta de transporte
coletivo. Devia ter uns 6 caras lá dentro, contando com o motorista e o
cobrador. Nós estamos na faixa da direita, e a besta na faixa do meio. O
Magra, numa atitude que não foi comunicada à nosotros, abaixou o vidro
do lado do motorista e fez sinal para que o cobrador abaixasse o vidro
da besta, como se estivesse querendo falar algo. O cobrador abriu o
vidro e ficou na espera do que o magrão tinha pra dizer. E ele disse:
- "Ai nessa besta só tem fresco e viado, começando por você, passando por todo mundo e terminando no motorista".
O cara perguntou, como se não tivesse acreditando: "Como é que é, rapaz?"
O magrão respondeu, dessa vez mais alto e já não se agüentando de tanto rir:
- "Isso mesmo que você ouviu, seu fresco, aí só tem corno, viado arrombado..."
Antes de ele terminar de falar, eu só vi as portas da besta se abrindo e descendo os caras dispostos a matar o magrão e quem estivesse junto com ele naquela sandice. O Magrão queria dobrar à direita pra entrar na Prudente e fugir, mas os poucos carros que estavam rodando na cidade naquela hora resolveram passar ali naquele trecho, naquele momento. Uma tapa ainda bateu no vidro, quando finalmente ele conseguiu fugir pela Prudente. Quando os sujeitos voltaram pra besta, nós já estávamos longe.
Decidimos
que a brincadeira estava indo longe demais e resolvemos ir pra casa. Em
Morro Branco, já ali perto do Edifício Michelle, estava um feliz
proprietário de uma Hilux preta, um senhor já de idade, que lavava
alegremente o seu brinquedo, desperdiçando a água do planeta. Novamente
não foi preciso dizer nada. O magrão estacionou o carro numa distancia
segura e até ele dessa vez quis participar da brincadeira, porque até
então ele só fazia dirigir o carro.
Todos os ovos foram
indo um a um, pra Hilux do senhor, que com medo de ser também melado
pelo ovos, não chegava nem perto do carro. A única reação dele era
gritar e ameaçar os atiradores de elite. Quando os ovos acabaram,
largamos a bandeja por lá e debandamos. Fui conseguir dormir somente
umas três horas apos chegar na cama, de tanto que ria me lembrando das
vitimas.
Meu pai acordou e veio me questionar pelo
ovos, que eu avisei de pronto que desconhecia o paradeiro dos mesmos.
Disse que quando cheguei em casa, não vi nenhum ovo. Que acho que ele
estava caducando, pois pensara ter comprado algo e não o fez. Ele saiu
coçando a cabeça.
A punição divina veio mesmo pra cima
do Magrão, afinal foi ele quem forneceu o veículo pra praticar o mal. Na
segunda-feira de manhã, chega uma viatura da polícia na oficina dele,
juntamente com um reboque, para guinchar o veiculo causador da baderna.
Apos uma "bola" de 50 reais, que era uma boa grana naquela época,
o carro do magrão foi aliviado e ele liga pra mim, conta o que houve e
puto da vida pergunta:
"Cachorra, viado, como esses
frescos descobriram o numero da placa do meu carro? Estavam todos
adulterados. Como eles iriam descobrir que os números eram diferentes e
tantas combinações são possíveis com aqueles números, como descobriram a
placa direitinho?"
Foi ai que eu falei pra ele: "Magrão,
aquele jornaleiro tinha poderes sobrenaturais, rapaz. Você não viu o
ovo que joguei nele e o ovo bateu catolé? Staine e Augusto foram jogar o
ovo nele e os ovos estouraram em cima deles? E o moleque nem se mexeu e
nem ficou com medo. Ficou parado, só observando. Eu digo a você que ele
tem poderes tão fortes que ele consegue ate vender a Tribuna do Norte".
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